Ontem, dia 19 de setembro, foi o Dia Nacional do Teatro. Seria um dia de comemoração como tantos outros, porque poderia ser uma autoafirmação de uma categoria que poderia arvorar-se em estabelecer sua importância no cenário cultural do nosso país. O fazer, o impor-se como artista, o elo com as instituições governamentais, a força do pensar, tudo isso coloca o ator, a atriz, o produtor de teatro na vanguarda na vida artística desta nação. Mas, temos mesmo o que comemorar? Como, depois de tanto tempo em segundo plano, de esvaziamento de agenda, de desmonte nacional, podemos concluir que haja uma comemoração? Neste país de desgoverno com a Cultura nacional, não esperamos mais nada a não a ser a virada que se aproxima, implorando que qualquer coisa seja menos ruim do que o que aí está.
Porém, sentimos também outras dores. Aquelas que para nós são muito caras. São as dores locais. As dores do eterno parto que é produzir a cultura teatral em nossa cidade, em nossa região. Os artistas da região são como anti-heróis cujas gestões municipais tratam com frequente desrespeito àqueles que desejam mostrar o cotidiano sob o olhar artístico, quase sempre lúdico ou com a nudez da realidade.
Caruaru é um exemplo duro e inflexível dessa desnatureza. Ao mesmo tempo que detém tantos espaços onde as artes cênicas deveriam ser inexoravelmente determinantes no pulsar cultural de uma cidade tão cantada aos quatro ventos, temos espaços de sobra e produção de menos. Um contraditório que esvazia um trabalho vitorioso, de grandes conquistas de prêmios nacionais e estaduais e que alimentarão somente aos livros de história. Somente o poder público é detentor de três espaços, O Teatro Joel Pontes, o teatro da Pracinha da Cultura e até mesmo um teatro no parque das rendeiras, distribuídos em diferentes partes da cidade porem sofrendo do mesmo mal: absolutamente nenhum funciona, nenhum está disponível. O Joel Pontes ainda tem um agravante, com a outrora importante e imponente Casa de Cultura José Condé menosprezada a anos, servindo de mero ponto de vendas de farinhas e derivados, sem o menor pudor. E ainda assim, planeja mais um, com a requalificação da estação ferroviária.
Outros espaços privados fogem as possibilidades ante uma política cultural longe de atender aos interesses artísticos dessa e de outras categorias. Os teatros Rui Limeira Rosal do SESC, o do SENAC e o Difusora, pelos seus custos ficam quase inacessíveis para a produção mirabolante pela criatividade e pobre de recursos financeiros que artistas e grupos dispõem. Os alternativos teatros João Lyra Filho, Licio Neves e Prazeres Barbosa sobrevivem pela força de vontade de quem os dirige e pela carência de modernização, já que não são impulsionadas por nenhuma política pública. Nesse quesito, o Lício Neves, sob o gerenciamento do Teatro Experimental de Artes – TEA, tem se distanciado, buscando sozinho os parceiros ideais para sua modernização. Então encontramos aqui o curioso caso de tantas casas culturais que poderiam abrigar as produções culturais e não prosperam como deveriam. Não tenho o direito de culpar alguma gestão municipal específica, mas tenho a obrigação de culpar todas porque foram/são omissas na preservação de seus patrimônios artísticos. A elite econômica também é culpada por isso. Não entendem ou não querem entender a força do Cultura como economia criativa. Num país em que 6% do PIB vem dessa força, qual seria o percentual do PIB caruaruense?
Talvez alguém queira jogar a culpa sobre os próprios artistas, pela inabilidade secular de articular ou se organizar. Pode até parecer. Porém convém lembrar sempre de uma frase de Bertold Brecht: “Primeiro a barriga, depois a moral!”. Os artistas estão muito mais preocupados em vencer as dificuldades reais num país miseravelmente dominado pela fome de tudo, para só então vencer suas utopias de mundo perfeito de questionamentos e mudanças através da sua arte. E este ciclo que insiste em permanecer, mata cada vez mais os sobreviventes da arte que já não produz seguidores como antes.
Que pena, Caruaru!
Claudio Soares
Produtor Cultural